Araripina também se firma em oásis da indústria têxtil

12:29 Blog do Adeildo Alves 0 Comentários


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2021

Berço do gesso, Araripina, a capital do Araripe, também é parte do livro O Nordeste que deu certo, de minha autoria, que vem sendo postado nos últimos dias. No enfoque do capítulo de hoje, o caminho aberto por Araripina, destacada ontem como maior reserva de gipsita do mundo, em busca de um lugar ao sol na área têxtil. 

Boa parte da malha comercializada no Nordeste, hoje, já sai de fábricas instaladas na cidade com incentivos da Sudene. Essa vertente da economia do Sertão do Araripe poderia, entretanto, estar hoje numa escala bem mais avançada não fossem a falta da matéria-prima na região, o algodão, e a escassez de água. Sonho dos empresários do município, a Adutora do Oeste saiu do papel, mas não atende as necessidades do parque têxtil em sua totalidade. Confira o texto original e no final a situação do polo, 28 anos após a edição do livro. 

A vez da indústria têxtil 

Capítulo 22

Segunda maior reserva do mundo em gipsita e campeã nacional em produção de gesso, Araripina já pode ser considerada, também, um polo têxtil influente no Nordeste. Só a Artesa (Araripe Têxtil S/A), operando atualmente com 28 mil fusos, produz 200 toneladas de fios de algodão/mês em plena fase crítica da seca, enquanto a Malharia e Tinturaria Artefil, funcionando apenas com 40% da sua capacidade, joga no mercado nacional 90 mil toneladas de malha/mês.

Tanto a Artesa como a Artefil foram implantadas na região há mais de 10 anos, num investimento de US$ 30 milhões, com recursos do Fundo de Investimentos do Nordeste (Finor) e outra parte bancada pelo grupo Valdeir Batista. O mesmo grupo está construindo um grande prédio, com uma área de 24 mil m2, para instalar, brevemente, outra unidade têxtil – a Pé de Serra -, com 40 mil fusos, cujo investimento é de US$ 40 milhões, sendo 50% repassados pelo Finor. Quando estiver funcionando, o faturamento do grupo, hoje em torno de US$ 20 milhões, será duplicado, e a oferta de emprego também. As duas empresas – a Artesa e a Artefil – empregam, hoje, 1.500 pessoas, sendo o setor têxtil, depois do gesso, o que gera mais mão-de-obra na Chapada do Araripe.

Todas as confecções do Nordeste compram malha diretamente à Artefil, em Araripina, e o Sudeste consome grande parte do fio de algodão feito na região. As indústrias do setor operam com tecnologia de primeiro mundo, tendo máquinas e equipamentos importados dos Estados Unidos e da Europa no que há de mais moderno hoje em dia. “Estamos em condições de competir em qualidade com qualquer país”, diz o empresário Valdeir Batista, líder do grupo e que, nas eleições de 90, conseguiu seu primeiro mandato de deputado estadual, pelo PFL.
      
Em Araripina, onde o charme da economia é explorar gipsita e produzir gesso, Valdeir resolveu apostar no futuro, criando alternativas de diversificação para o Distrito Industrial. Os investimentos estão dando certo. “A Sudene acreditou em nosso projeto”, diz ele, acrescentando que o apoio da instituição está sendo fundamental para que Araripina passe a ser, brevemente, o segundo maior polo têxtil do Estado, superado apenas pelo Grande Recife.

“A malha que produzimos hoje é disputadíssima no mercado”, reforça o empresário, que também possui uma unidade de beneficiamento de algodão e de extração de óleo. Só que, devido ao agravamento da estiagem, algodão passou a ser um produto praticamente em extinção. “Nosso beneficiamento de algodão não chega a 10%”, diz ele, acrescentando que a matéria-prima importada sai 10% mais barata do que a nacional. 
       
Algodão da Grécia

A exemplo do que ocorre com praticamente todas as fiações do Nordeste, a de Araripina importa o algodão (a matéria-prima). “Atualmente, estamos trazendo da França e da Índia”, diz o empresário Valdemir Batista, vice-presidente do grupo.

Os países que mais fornecem a matéria-prima às empresas da região são, pela ordem, Rússia, Grécia, França, Índia, Argentina e Afeganistão. Valdemir lamenta que o Nordeste, que já foi um dos maiores produtores de algodão, hoje com um parque têxtil tão promissor, não possa contar com uma participação importante na oferta da matéria-prima.

Mesmo importando caro o algodão, o grupo parece ter uma estrutura sólida, apesar da recessão e dos dias de crise que vive o País. A fiação tem um faturamento mensal de US$ 12 milhões e a malharia de US$ 7,5 milhões. “Hoje, o que produzimos tem mercado assegurado”, revela Valdemir, para quem Araripina tem todas as condições de progredir não apenas em função do gesso, mas também da indústria têxtil. “Nós estamos esperando a Sudene liberar o financiamento para triplicar a nossa produção no momento em que a nova fiação passar a funcionar”, explica.

Segundo ele, os tecidos fabricados em Araripina, tanto o moletone com o cotton Lycra ou lacoste, em múltiplas cores, abastecem também os atacadões da sulanca, em Santa Cruz do Capibaribe, maior centro de venda de panos do Nordeste e o segundo do país. “Até mesmo aqui em Araripina tem muita gente vivendo de confecções com tecidos fabricados por nós”, garante. 

A tinturaria do grupo também funciona a todo vapor, produzindo 90 toneladas/mês. Computadorizada, possui máquinas que lavam 2,5 mil quilos de tecidos por dia. “Nós trabalhamos com 34 artigos de cores”, diz Valdemir, para acrescentar que na tecelagem existem 12 máquinas, com capacidade de processar 3 mil quilos/dia.

Lei seca atrapalha

As indústrias têxteis, assim como as de gesso, dependem basicamente de um só projeto: a Adutora do Oeste, única alternativa capaz de resolver o problema da falta d’água em Araripina e em mais 18 municípios vizinhos. O projeto é caríssimo e a União não assegurou até agora os recursos que garantam a viabilização dos 800 km de canos, para puxar a água do rio São Francisco. 

Enquanto não se define isso, os empresários da área pagam um preço caro para manter os negócios. A falta d’água atinge, sobretudo, a indústria têxtil. O grupo Valdeir Batista recorre a carros-pipas para não interromper o funcionamento das duas unidades instaladas em Araripina. “O mais grave – diz Valdeir – é que a reserva hídrica que estamos utilizando está nas últimas, e nos próximos dias teremos que recorrer a Ouricuri, que fica a 70 km”.

A Adutora do Oeste é um sonho antigo da população do Araripe. A prefeita de Araripina, Dionéa Lacerda, revela que sem a obra dificilmente a região continuará produzindo gesso e tecidos. “Desse jeito, ninguém mais virá para Araripina”, prevê, acrescentando que todo esforço tem que ser feito pelas lideranças regionais para assegurar a construção da adutora.

Enquanto isso, Araripina, considerada a capital do Araripe, está literalmente com os seus mananciais esgotados. A Pousada do Araripe, o melhor hotel da cidade, só não fechou recentemente porque a prefeita do município mandou perfurar um poço de emergência. “A piscina do hotel não funciona há mais de dois meses”, revela um dos funcionários. Mesmo com o poço, a água usada pelos hóspedes do hotel é salobra.

Maquinaria moderna

Quarenta por cento dos US$ 30 milhões investidos pelo grupo Valdeir Batista no parque têxtil de Araripina foram direcionados para compra de máquinas e equipamentos. Da Alemanha e da França, por exemplo, foram importadas modernas conicaleiras rotativas, com robôs, para emendas de fio sem nó. Da Suíça, vieram os equipamentos para instalação do laboratório de alta precisão técnica. 

Informatizado, o laboratório analisa desde o algodão à capacidade da fibra, espessura e resistência, além da análise do fio nas diversas fases de processamento, para obter um padrão de qualidade exigido pelo mercado nacional de internacional. 

A Artesã fabrica fios de 26 e 30 para o mercado de alta qualidade e para o mercado de malharia, abastecendo todo o Nordeste, São Paulo, Rio de Janeiro, Minas e Santa Catarina. Quanto à matéria-prima, o grupo Valdeir importa cerca de 220 toneladas por mês.

Segundo Valdeir Batista, a malharia, que opera com cores mercerizadas, está ampliando sua produção, através da compra de equipamentos adequados para funcionar uma estamparia modelo na região. “Já produzimos cotton lycra, lacoste e uma variedade enorme de tecidos”, diz o empresário. 

De olho no mercado nacional, Valdeir espera receber o restante do financiamento da Sudene para colocar a segunda fiação em operação, com 40 mil fusos. “Vamos dar um grande impulso à região”, prevê ele, adiantando que o Finor, que garante 50% dos recursos investidos no projeto, já aprovou a instalação da nova unidade, que terá, ainda, 20% financiados pela rede bancária, a juros de mercado. “Estamos caminhando para deixar Araripina com uma das maiores fiações do Nordeste”, comemora.

Valdeir diz que fez opção pela importação da matéria-prima por dois motivos básicos: escassez da região e preços mais atrativos. “Por incrível que pareça, o algodão que trazemos da Índia, por exemplo, sai 10% mais barato do que o nacional”, diz. Como empresário da região, ele defende a volta da produção de algodão, mas acha que faltam incentivo governamental e condições. “Estamos enfrentando a maior seca do século. Essa adversidade é um grande complicador”, afirma.    

28 ANOS DEPOIS: 

- Araripina tem uma população em torno de 84,8 mil habitantes. Em 1993, o município tinha 70 mil habitantes. 

- Juntamente com Ouricuri, Ipubi e Trindade, a cidade, conhecida como a “Capital do Gesso”, comanda o maior polo gesseiro da América Latina. É responsável por 95% do gesso consumido no Brasil. Em 1993, a região detinha 90% da produção no País.

- As reservas de gesso em Pernambuco chegam a 2,8 milhões de toneladas.

- O polo gesseiro do Estado gera 12 mil empregos diretos e 60 mil indiretos.

- A crise econômica levou o Governo Federal a anunciar, no início de 2016, medidas de incentivo ao polo gesseiro, sobretudo com relação à comercialização para o exterior. A meta de exportação internacional de gesso para é atingir US$ 500 mil. O polo gesseiro pernambucano espera que as exportações para outros países cheguem a US$ 800 mil. A crise fez com que a produção caísse de 7,2 milhões de toneladas em 2014 para 5 milhões de toneladas em 2015. Foram fechadas 1,5 mil vagas de emprego. 

- O polo gesseiro pernambucano movimentou, nos últimos anos, US$ 350 milhões/ano (R$ 1,4 bilhão/ano). Em 1993, o gesso movimentava US$ 240 milhões/ano (R$ 960 milhões/ano). 

- A atividade engloba, hoje, 42 minerações ativas, 180 calcinadoras e 450 fabricantes. Em 1993, eram 200 fabriquetas, 60 calcinadoras e 16 mineradoras em funcionamento.

- A Mineradora Rancharia é destaque em Araripina há mais de 29 anos. Hoje, é uma empresa de dimensionamento de pedras e blocos. Em 1993, a Indústria Ypiranga, do Complexo Mineradora Rancharia, exportava 500 mil caixas de giz/mês.

- Continuam no mercado seis empresas que atuavam no polo gesseiro em 1993. São elas: Gipsita S.A, Mineradora Ponta da Serra, Companhia de Cimento Portland Paraíso, CBE (Companhia Brasileira de Equipamento), Mineradora São Jorge e Mineração Alto Bonito. 

- A indústria têxtil de Araripina continua em destaque. A Araripe Têxtil S/A Artesã e a Artefil Malharia, do grupo Valdeir Batista, que já faziam sucesso em 1993, estão a pleno vapor. A Artesã produz 3,6 milhões de kg de fio de algodão por ano. A Artefil produz 120 toneladas de malha 100% algodão/mês. Em 1993, a Artesã produzia 200 toneladas de fios de algodão/mês. A Artefil produzia 90 toneladas de malhas/mês. 

- A Adutora do Oeste continua sofrendo críticas por não garantir o abastecimento d’água na região de Araripina. Políticos do Sertão do Araripe são unânimes em afirmar que a Adutora está obsoleta e não mais comporta a demanda da região, precisando ser ampliada. A obra levou anos para ser concluída e teve o segundo trecho inaugurado, em 2002, pelo então governador Jarbas Vasconcelos, ficando parcialmente pronta para levar água a cerca de 100 mil pessoas no Sertão do Araripe. Em 1993, a obra da Adutora não foi assegurada pela União, pois era considerada muito cara. 

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