Raquel: a vaia é linguagem universal de incomodo do povo
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Blog do Adeildo Alves
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Por Osório Borba Neto
Há certas coisas na política que não precisam de manual de instruções. A vaia, por exemplo. A vaia é o “oxe” moral do povo: sai rápida, certeira, dispensa legenda e não admite dublagem. É o aviso sonoro do Brasil profundo – aquele que não precisa de Datafolha nem de teórico da alma popular para perceber quando a paciência acabou.
Pois muito bem: a governadora de Pernambuco subiu ao palco esta semana, ajeitou o microfone com o esmero de quem vai anunciar a redenção do estado – e levou, mais uma vez, aquela vaia arretada, redonda, soprada de todos os cantos, como se o povo tivesse ensaiado de véspera no terreiro.
Aí veio a explicação criativa: “Se eu fosse homem, não seria vaiada.” Ave Maria! Como se a vaia, essa entidade democrática, pedisse identidade de gênero antes de saltar estrepitosa da goela do povo. Vaia não escolhe sexo, não escolhe roupa, não escolhe partido, escolhe alvo. E escolhe quando o serviço não tá prestado.
Raquel ouviu as vaias, mas não ouve as queixas.
O povo, que tem faro melhor do que cão farejador de caatinga, olha ao redor e vê o quê? A saúde tropeçando feito bode velho em ladeira; a violência fazendo hora extra; a educação pedindo socorro com cartaz na mão; o transporte público chorando óleo pelos cantos; e a economia real, aquela que pesa na feira, no gás, na passagem, só piorando. Tá sobrando propaganda e faltando Estado.
Com esse panorama, o povo não escreve bilhete, não envia ofício, não protocola reclamação. Ele vaia. Vaia porque é a sua poesia sonora de protesto. Vaia porque é maneira de dizer: “Tu me prometeu a lua, Raquel, e eu continuo esperando pelo candeeiro.”
Mas o mais curioso é que a governadora não entendeu a mensagem. A vaia falava alto, claro, com sotaque e com intenção. E ela, em vez de escutar, reagiu com brabeza, como aquele sujeito que tropeça no próprio pé e sai xingando o calçamento por ter cruzado o caminho.
Falta-lhe o ouvido que todo bom gestor deveria ter: o ouvido do povo. Não o ouvido cheio de filtro, de assessor otimista, de bajulador do palácio. O ouvido limpo, o de quem se senta no banco da praça e escuta o murmúrio da vida real.
Porque vaia, meu amigo, é igual trovão no sertão: quando começa a ribombar, é sinal de que alguma coisa grande tá se ajeitando… ou se desajeitando. Ignorar vaia é como virar as costas pra chuvarada: a pessoa até pode fingir que não tá vendo, mas quando dá fé já tá pingando dos pés à cabeça.
No fim das contas, a vaia é o recado mais antigo, mais democrático e mais sincero que chega ao governante: o povo tá insatisfeito, e não quer ouvir explicação cabeluda. Quer mudança. Quer ação. Quer respeito.
E se o governo não aprende pela vaia, aprende pela urna.
Porque a vaia é só o ensaio.
A eleição é o espetáculo.
E quando o povo fecha a boca… é aí que ele fala mais alto.



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